2. Acessibilidade como forma de democratização da informação e do conhecimento

 

As questões sobre acessibilidade são geralmente associadas a pessoas com deficiência (PD) ou necessidades educacionais especiais (NEE). No entanto, ao contrário do que se pensa, a acessibilidade envolve a todos, como por exemplo, mulheres grávidas, pessoas idosas, que tenham limitações relacionadas à atenção, memória, leitura, compreensão, baixa estatura, sobrepeso, entre outros. A Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT NBR 9050 (2004) define acessibilidade como “possibilidade e condição de alcance, percepção e entendimento para a utilização com segurança e autonomia de edificações, espaço, mobiliário, equipamento urbano e elementos”. A mesma norma define o termo acessível como,

 

Espaço, edificação, mobiliário, equipamento urbano ou elemento que possa ser alcançado, acionado, utilizado e vivenciado por qualquer pessoa, inclusive aquelas com mobilidade reduzida. O termo acessível implica tanto acessibilidade física como de comunicação. (ABNT, 2004)

 

Segundo Nicholl (2001), acessibilidade é o termo geral usado para indicar a possibilidade de qualquer pessoa usufruir de todos os benefícios da vida em sociedade, entre eles o uso da Internet. Entende-se, que a Internet, além de ser um espaço democrático que possibilita às pessoas interagirem umas com as outras, disponibiliza a informação e o conhecimento como um instrumento emancipatório para cada indivíduo.

O Relatório de Pesquisa de Opinião Pública Nacional (BRASIL, 2010) sobre as condições de vida das pessoas com deficiência no Brasil, resultado de uma pesquisa quantitativa realizada em 2010 com pessoas com deficiência cadastradas no IBDD (Instituto Brasileiro dos Direitos da Pessoa com Deficiência), indica que 77% dos entrevistados usam a Internet como principal meio de comunicação para buscar informações. Neste contexto, é preciso tornar acessível todas as informações, conhecimentos, documentos, sistemas, proporcionando a inclusão, fornecendo possibilidades de acesso e compreensão das informações, por meio das tecnologias para todas as pessoas.

Neste sentido, as TIC trazem um grande potencial de inclusão para as pessoas com deficiência ou necessidades educacionais especiais, pois permitem eliminar barreiras, tanto por meio de tecnologia assistiva, quanto pelas potencialidades dos aplicativos, ferramentas, produtos e serviços disponibilizados atualmente. Entende-se por barreiras nas comunicações e na informação, qualquer obstáculo que dificulte a expressão ou recebimento de informações por meio de TIC; Já barreiras atitudinais, são atitudes que prejudicam a participação social da pessoa com deficiência em igualdade de condições e oportunidades com as demais pessoas; e as barreiras tecnológicas, são as que dificultam o acesso da pessoa com deficiência às tecnologias (SETUBAL, 2016).

Algumas possibilidades para eliminar essas barreiras são, por exemplo, fornecer informações claras, em diversos formatos, como em Português, em Libras, em imagem, em áudio, em braille, com um bom contraste, com legenda, descrição, que possam ser entendidas pelas pessoas independente de suas deficiências ou limitações. Além disso, superar os preconceitos que produzem a discriminação, demonstrando como se pode agir com as pessoas para evitar a exclusão.

O Decreto nº 6.949/2009, em seu artigo 21 que trata sobre a liberdade de expressão e de opinião e acesso à informação, acorda que,

 

Os Estados Partes tomarão todas as medidas apropriadas para assegurar que as pessoas com deficiência possam exercer seu direito à liberdade de expressão e opinião, inclusive à liberdade de buscar, receber e compartilhar informações e ideias, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas e por intermédio de todas as formas de comunicação de sua escolha, conforme o disposto no Artigo 2 da presente Convenção, entre as quais:

a) Fornecer, prontamente e sem custo adicional, às pessoas com deficiência, todas as informações destinadas ao público em geral, em formatos acessíveis e tecnologias apropriadas aos diferentes tipos de deficiência;

b) Aceitar e facilitar, em trâmites oficiais, o uso de línguas de sinais, braille, comunicação aumentativa e alternativa, e de todos os demais meios, modos e formatos acessíveis de comunicação, à escolha das pessoas com deficiência;

c) Urgir as entidades privadas que oferecem serviços ao público em geral, inclusive por meio da Internet, a fornecer informações e serviços em formatos acessíveis, que possam ser usados por pessoas com deficiência;

d) Incentivar a mídia, inclusive os provedores de informação pela Internet, a tornar seus serviços acessíveis a pessoas com deficiência;

e) Reconhecer e promover o uso de línguas de sinais. (BRASIL, 2009)

 

Diante disso, é necessário superar as dificuldades, promovendo a inclusão social e digital, fornecendo as informações em formatos acessíveis, assegurando que as pessoas com deficiência possam exercer seus direitos, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas. A Acessibilidade Digital (AD) é a capacidade de um produto digital ser flexível o suficiente para atender às necessidades e preferências do maior número possível de pessoas, além de ser compatível com tecnologias assistivas usadas por pessoas com necessidades especiais (DIAS, 2003). Sendo assim, possibilita que todas as pessoas tenham acesso às TIC por meio de hardwares e softwares que oferecem recursos para ultrapassar barreiras de acesso a informações, com conteúdo em formatos acessíveis.

Segundo a Lei nº 13.146/2015, consideram-se formatos acessíveis “os arquivos digitais que possam ser reconhecidos e acessados por softwares leitores de telas ou outras tecnologias assistivas que vierem a substituí-los, permitindo leitura com voz sintetizada, ampliação de caracteres, diferentes contrastes e impressão em Braille” (BRASIL, 2015). Entende-se então, que a acessibilidade digital não se refere apenas ao acesso à informação por meio das TIC, mas também à eliminação de barreiras de comunicação, equipamentos e software adequados às diferentes necessidades, bem como, a disponibilização da informação deve ser compatível com as tecnologias assistivas e com os diferentes modos de uso do computador.

Desse modo, as pessoas terão acesso a possíveis instrumentos de emancipação, tornando-se sujeitos parte dos grupos sociais, oportunizando a interação social em um constante exercício de democratização e inclusão. A democratização da informação e do conhecimento passou a ganhar maior espaço na sociedade com o advento das TIC. A democratização pressupõe ampliar o acesso, ou seja, tornar acessível a informação e o conhecimento ao maior número de pessoas possível, em igualdade de oportunidades e de condições e respeitando o direito à informação.

Assim como afirma Chauí (1995), “[...] a democracia funda-se na igualdade (contra a hierarquia), no direito à informação (contra o segredo) e na invenção de novos direitos segundo novas circunstâncias (contra a rotina)”. Segundo a mesma autora, “[...] a democracia é a criação, reconhecimento e garantia de direitos [...]”. Esses direitos serão obtidos quando as pessoas tiverem acesso às informações e oportunidade de exercer os seus direitos democráticos, tendo um papel ativo na sociedade.

Segundo Messa et al. (2011, p. 79) “na democracia contemporânea, deveria haver respeito e espaço para a manifestação das minorias, na medida em que o principal pilar de sustentação da democracia consiste no respeito aos direitos fundamentais”. Desse modo, o desenvolvimento da democracia e a participação dos cidadãos dependem, primeiramente, de acesso, sem barreiras, à informação e ao conhecimento. Isso pode efetivar-se por meio da educação, pois uma Instituição de ensino que busca uma educação democrática deve pensar nas diferenças individuais e em ações que contribuam com a participação e permanência dos alunos. Neste sentido, Saravali (2005, p. 100) afirma que,

 

[...] o verdadeiro ensino democrático é aquele que não somente garante o acesso, mas sobretudo a permanência do aluno, enfocando a formação integral e não somente o preparo profissional. Portanto, quando esse aluno chega à instituição superior e não consegue usufruir do ensino que ela e seus mestres promovem, acompanhar suas leituras e exercícios, desenvolver habilidades, aprender a acessar o conhecimento, a educação está longe de atingir seu ideal democrático.

 

Nessa perspectiva, as Instituições de ensino devem contribuir para a redução das desigualdades, diminuindo as dificuldades enfrentadas pelos alunos, proporcionando acessibilidade e eliminação de barreiras que impedem a participação e o aprendizado. Para Tapscott e Williams (2007, p. 150) “a democratização das ferramentas de publicação de mídia está rapidamente transformando a nossa percepção de como experiência, relevância e profissionalismo se desenvolvem na mídia”. Neste sentido, o processo de democratização pode ser facilitado com experiências educacionais de inclusão digital baseadas em TIC. Assim como afirma Silva et al. (2005),

 

A educação para a informação está, portanto, no cerne de uma nova e desejada sociedade “incluída”, que seja amparada na consideração “cuidadosa” de uma educação que envolva novas e ousadas abordagens relacionadas ao acesso à informação por meio das TIC.

 

Uma possibilidade de democratizar o acesso à informação e ao conhecimento, no contexto das TIC, é a criação e disponibilização de documentos digitais acessíveis. Já que, de acordo com Castells (1999, p. 50),

 

O século XXI está sendo marcado pela universalização das tecnologias digitais e dispositivos móveis conectados em redes, que nos colocam em constante interação com (ciber) espaços sócio-técnicos onde a comunicação ocorre em lugares não fixos registrando fatos e informações no instante em que eles acontecem, uma verdadeira revolução tecnológica.

 

Nesses espaços chamados de ciberespaços ocorre a construção da cidadania virtual, onde o acesso irrestrito se torna necessário e a inclusão digital um meio eficaz de promover a acessibilidade a todos, sem distinção. Conforme refere-se Warschauer (2006, p. 25) quando afirma que “a capacidade de acessar, adaptar e criar novo conhecimento por meio do uso das TIC é decisivo para a inclusão social na época atual”.

Portanto, a democratização da informação e do conhecimento pode efetivar-se por meio da acessibilidade em documentos digitais, desenvolvidos com base nas orientações de acessibilidade, atendendo aos princípios do desenho universal e sendo compatíveis com recursos de tecnologia assistiva.